Entre os religiosos existe um conceito generalizado de que sendo bom, frequentando regularmente o templo de sua crença e contribuindo com o "sagrado dízimo", a reserva do esplendor do Céu já estará garantida.
Mas o Evangelho de Jesus não nos oferece certeza alguma nesse sentido, pois a abrangência do termo limpo de espírito vai muito além do que imaginamos.
O médium Chico Xavier, através de Humberto de Campos, recebeu esta mensagem psicografada que dá uma visão interessante dessa expectativa que se têm. 'Nos limites do Céu':
"No extremo limite da Terra com o Céu, aportou um peregrino envolto em nevado manto.
Irradiava pureza e brandura. A fronte denunciava-lhe a nobreza pelos raios diamantinos que emitia em todas as direções. Extenso halo de luz assinalava-lhe a presença.
Recebido pela entidade angélica, que presidia à importante passagem, apresentou sua aspiração máxima: ingressar definitivamente no paraíso, gozar-lhe o descanso beatífico.
O divino funcionário, embora admirado e reverente perante espírito tão puro, esboçou o gesto de quem notava alguma falha menos visível ao olhar inexperiente e considerou:
– Meu irmão, rendo homenagem à alvura de tuas vestes, entretanto, vejamos se já adquiriste a virtude perfeita.
Sorridente, feliz, o viajor vitorioso colocou-se à escuta.
– "Conseguiste entesourar o amor sublime?" – perguntou o anjo, respeitoso.
– "Graças a Deus!" – informou o interpelado.
– "Edificaste a humildade?"
– "Sim."
– "Guardaste a esperança fiel?"
– "Todos os dias."
– "Seguiste o bem?"
– "Invariavelmente."
– "Cultivaste e pureza?"
– "Com zelo extremado."
– "Exemplificaste o trabalho construtivo?"
– "Diariamente."
– "Sustentaste e fé?"
– "Confiei no Divino Poder, acima de tudo."
– "Ensinaste a verdade e testemunhaste-a?"
– "Com todas as minhas forças."
– "Conservaste a paciência?"
– "Sem perdê-la jamais."
– "Combateste os vícios em ti mesmo, tais como a vaidade e o orgulho, o egoísmo e o ciúme, a teimosia e a discórdia?"
– "Esmeradamente."
– "Guerreaste os males que assolam a vida, como sejam o ódio e a perversidade, a insensatez e a ignorância, a brutalidade e a estupidez?"
– "Sempre."
O anjo interrompeu-se, refletiu longos minutos, como se estivesse em face de grave enigma, e indagou:
– "Meu amigo, já trabalhaste no inferno?"
– "Ah! isto não!" – respondeu o peregrino, escandalizado – "Como haveria de ser?"
O fiscal da celeste alfândega sorriu, a seu turno, e observou:
– "Falta-te semelhante realização para subir mais alto."
– "Oh! que contra-senso!" – aventurou o interessado – "Como servir entre gênios satânicos, de olhos conturbados pela permanente malícia, de ouvidos atormentados pela gritaria, de mãos atadas pelos impedimentos do mal soberano, de pés cambaleantes sabre o terreno inseguro, com todas as potências da alma perturbadas pelas tentações?"
– "Sim, meu amigo" – acentuou o preposto divino – "o bem é para salvar o mal, o amor foi criado para que amemos, a sabedoria se destina em primeiro lugar, ao ignorante. A maior missão da virtude é eliminar o vício e amparar o viciado."
"E, perante o assombro do ouvinte, rematou:"
– "Torne à Terra, desce ao inferno que o homem criou e serve ao Senhor Supremo, voltando depois... Então, cogitaremos da travessia. Lembra-te de que o Sol, situado cerca de cento e cinquenta milhões de quilômetros além do teu mundo, larga raios luminosos e salvadores ao mais profundo abismo planetário..."
Em seguida, o controlador da Porta Celestial cerrou a passagem ligeiramente entreaberta e o peregrino, de capa lirial, espantadiço e desapontado, sentou-se um pouco, a fim de meditar sobre as conquistas que havia feito.
Esta é apenas uma mensagem simbólica retratando uma realidade que ocorre a cada segundo com os irmãos dispersos neste campo de provações que se chama Terra, no instante da travessia a que todos seremos chamados, um dia.
Convém observar com atenção o nosso comportamento, de maneira a evitar surpresas desagradáveis aos nossos sentimentos, quando entregarmos o passaporte na travessia compulsória da Aduana da Vida.
Obra Luz acima, de Irmão (Humberto de Campos), por Chico Xavier.